quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Alterego ou esquizofrenia


Você e essa sua mania de ser sempre boa, sempre correta. Você obedece, concorda, perdoa. Você aceita, não fala, não grita, não bate nem discute. Você sabe que, se alguém viesse te bater, você não revidaria, pois não se rebaixaria ao nível da pessoa e, além disso, não suporta violência. E é por isso que, metaforicamente, as pessoas às vezes te batem e você não revida e nem faz nada. Esse seu pavio curto para certas coisas, seu gênio forte e sua atitude nem sempre aparecem quando mais deveriam aparecer. E então você cospe tudo que te come na forma de palavras para postá-las em algum lugar e, em certos casos, espera que alguém leia e se identifique. Você joga a sua angústia em um papel ou em um documento do Word e fica por isso mesmo, pois não consegue dizer na cara da pessoa que ela está sendo no mínimo estúpida. Tudo bem que o fato de não conseguir olhar nos olhos de alguém por tanta intolerância, impaciência ou raiva às vezes te priva de conseguir dizer a esse alguém o que te fere e incomoda. Mas muitas vezes é porque você não consegue mesmo. Por isso que eles te batem: sabem que você não vai revidar. E o pior: sabem que você vai perdoar. Paz e amor, “all you need is love”, suas palavras de vida, seu lema. Você preza muito por seus amores e amizades, têm medo de perdê-los, por isso perdoa, aceita calada. Tanta coisa que você sempre quis dizer e nunca disse! Está aí a sua fraqueza, sua melancolia que você só divide com a Amelie Poulain ou em sua sala de terapia.

Você tem que arrumar seu quarto, você não pode ir a festas, você não pode ter essa nota, você tem que resolver isso essa semana, ‘sorria, você está sendo provocada’, você tem que ligar pra quem diz que sente saudades de você e não te liga, você tem que correr atrás, você tem que perguntar, você tem que reclamar, você tem que se impor, você tem que botar pra fora o que sente, você tem que ouvir, você vai mesmo fazer só cinema?, e você não vai fazer na UFF?, você é muito certinha, você ta muito estressada. Você acha que às vezes falar de você mesma é egocentrismo (por isso está escrevendo em terceira pessoa) e não gosta de ficar falando sobre suas qualidades sempre, mas sabe de uma coisa? Você é uma santa. Você é muito boazinha. Não gosta de colocar-se no lugar de vítima, mas não percebe que não é isso que você está fazendo: reconheça que você, em certos casos, é realmente a “vítima”, você está sendo sacaneada. Mas você se cala, apenas se cala... Você e essa sua mania de sempre ser boa!

“Nina, você vai ter de entender, tem gente que é deste jeito: não gosta de despedidas. Não chore, Nina, não chore. Ou melhor: chore bastante. A gente afoga nas lágrimas a dor que não entendemos. Mas espere, Nina, espere, porque há duas razões para você não chorar.” - Ziraldo, do livro "Menina Nina".

Marina Martins

terça-feira, 6 de novembro de 2012

308


PÁlma

Pobre de ti:
nasceste mosquito.
Tu até deves rir
com o quanto me irrito.

Teu barulho agonizante
me desperta à noite,
ó mosquito implicante!
Levarei-te ao açoite.

Tua figura nefasta
marca em mim uma picada.
O teu voo que te arrasta
deixa-me atordoada.

Ó desgraçado inseto!
Afasta de mim tuas asas,
que te atinjo num golpe certo,
e então no chão tu repousas.

Já estou por aqui
com teu pudor infinito (PÁ!)
(Bem feito.) Pobre de ti:
nasceste mosquito.

Marina Martins

“Às vezes te odeio por quase um segundo, depois de amo mais”


Eu te odeio. Você me fez passar três horas morrendo de fome, sabendo que eu estava morrendo de fome, e nem percebeu. Você não prestou atenção; nem em mim, nem em nada. Aliás, prestou sim: em você mesmo. E sabe o que mais odeio em você? O fato de eu não conseguir odiá-lo quando eu mais quero. Você não consegue não ser fofo. Enquanto eu tento sustentar-me em minha postura de irritada, você me aparece na mão com uma miniatura de gaita. Uma miniatura de gaita! Como consegue ser tão irritantemente fofo? A gaitinha era menor que o seu mindinho! Sem querer, perco a compostura e sorrio. (É sorriso de ódio!) Aos poucos, vou sendo levada pela sua fofura. Impossível odiá-lo por mais de um segundo. Não consigo, pretendo e acho que nunca vou conseguir. Eu gosto de não conseguir. Então, percebo o quanto o amo. Eu amo o fato de não saber odiá-lo. Chego em casa e lá está a minha cama, do jeitinho que você a deixou, arrumadinha e com os meus bichinhos deitados e cobertos. Agora cá estou, deitada (infelizmente, sem você ao meu lado), amando te amar. Estou lembrando de como você conseguiu me aguentar em mais uma das minhas crises de sensibilidade hoje. Nossa, cara, você é incrível. Eu te amo.

Marina Martins