terça-feira, 28 de outubro de 2014

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Sentiu-se

Essas lagrimas
Afogadas em nó
Perfurando-me
Alimentando-se
De angústias
De aflições
A testa enrugada
O estômago dolorido
A cabeça doída
Os ombros duros
Sinais de que
Senti.
Sem ti.
Sentiu-se.

Marina Martins

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Palco

Me recebe, aquele palco
De figurino ou de marina
Descalça ou usando salto
Sou inocente, sou assassina

Sou criança, estou presa
E a plateia crê em mim
Saio com dores, saio ilesa
Grito que não, digo que sim

Perco o equilíbrio e quase caio
Percebo que meu corpo treme
Do coração pulsante, eu me abstraio
E sei que a mente geme

Essa sensação inexplicável
Do conforto de nervosismo repleto
A perfeição inalcançável
Eu deixam o meu ser completo

Marina Martins

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Noite

O silêncio absoluto da rua
E de casa
Beba a tua
Cachaça
Sem se esquecer
De mim
Me entorpecer
Assim
Não vale
Me dê
Mais um gole
Me vê
Sozinha aqui
Enquanto
Você aí
Me bebe
Um tanto
Afoga
O pranto
E eu
Pronto.
Dormi.

Marina Martins

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

O aborto.


Sem títulos poéticos. Dessa vez, fui curta e grossa. Há um tempo tenho vontade de escrever sobre esse assunto tão polêmico, mas não escrevo, exatamente por ser tão polêmico. Mas e daí, não é mesmo? Tem tanta gente por aí expressando suas opiniões, por que eu não vou expressar a minha? Decidi, finalmente, por escrever. Esse blog é o meu espaço, lugar que tenho para escrever o que penso sobre o que quero, o que quero sobre o que penso. Se não for aqui, onde mais? Resolvi, então, embasar meus argumentos em argumentos contrários e a favor sobre o assunto, tanto os já ditos quanto os já escutados (ou lidos) por mim. À medida que apontá-los aqui, vou construindo a minha posição, que, já adianto logo, é de defesa.

É uma vida. Quando mais nova, eu tinha uma posição meio ambígua em relação ao assunto. Não entendia muito bem essa coisa de abortar. Por um lado, achava que as mulheres deveriam escolher o que é melhor para elas e para seus corpos. Por outro, eu tinha pena daquele bebê que poderia crescer ali naquela barriga e repetia a frase “é uma vida”. Fui crescendo e percebendo que não é bem assim. Aquele “bebê” ainda não é um bebê. É um ser que não está formado, não sei se chamaria de vida.

Assassinas. Exatamente pelo fato da criança a ser abortada ser uma vida, as mulheres que abortam são assassinas. Gente, bota exagero nisso, né? Se uma mulher grávida de seis ou sete meses abortasse, o argumento até seria válido, mas não é o caso. Alguém que optou pelo aborto não está fazendo isso com a intenção de assassinar ninguém, apenas não é a hora dela colocar uma criança no mundo. E melhor que essa criança não seja colocada, do que viva em condições que não mereça.

Eu até entendo essa aflição toda que as pessoas têm em relação ao aborto, eu também tenho aflição. Eu acho que não abortaria, mesmo se engravidasse agora. Até porque, eu teria medo de ter alguma complicação e não poder mais engravidar. Mas isso não me faz sentir no direito de opinar sobre a opção de ninguém. E, ainda, isso não quer dizer que eu seja contra o ato do aborto. Todas as mulheres que abortam sabem que isso é a última opção. Não conheço ninguém que pense “ah, vou transar sem camisinha, porque se engravidar, é só abortar”. Não acredito que esse pensamento exista, sinceramente. Todas as mulheres sabem que há um risco no ato, ainda mais ele sendo ilegal, ou seja, sem sabermos de que forma é feito.

Egoísmo. Outro dia, li que as mulheres que abortam são egoístas. Egoístas porque existem pessoas que não podem ter filhos, então dependem do abandono de bebês pela parte de mulheres que não queiram tê-los. Ou seja: a mulher deve ficar nove meses carregando uma criança para depois abandoná-la em um orfanato, sem saber se a futura família dela será boa. Falar é fácil. Agora, carregar um neném durante nove meses e pari-la, é bem diferente de tirá-lo logo no início da gestação, quando ainda nem está formado. Esse tempo cria um laço afetivo entre a mulher e a criança, dificultando ainda mais o fim da relação entres elas. E imagina a mulher que for estuprada? Ela deve carregar o fruto de um estupro durante nove meses? E pari-lo? E outra, está cheio de crianças abandonadas procurando por novos lares, e sempre estará. Mesmo que o aborto seja legalizado, não são todas as mulheres que abortarão quando não desejarem o bebê. Em vez de esperar por novos abandonos de crianças, por que não dar um lar a uma que já não tenha? Elas estão esperando por isso!

Egoísta, então, é mesmo a mulher que aborta, né? Não é quem diz um argumento como esses? A mulher deve, de acordo com esse pensamento, pensar em quem adotará seu futuro bebê, em vez de pensar na sua felicidade e, acima de tudo, sua saúde. Ah sim, e todo o sofrimento que vai vir junto com o desapego daquela criança parida por ela.


O fato é que, a meu ver, não há argumentos que sustentem o fato de o aborto não ser legalizado. Mesmo sendo proibido, mulheres praticam o ato, clandestinamente. Essas mulheres se expõem a riscos que desconhecem, não sabem em que condições vão abortar. Assim, algumas acabam morrendo, como vimos dois casos recentes. Essa realidade tem que mudar. O assunto é sério, é urgente. Não podemos deixar que mais mulheres morram até que o ato seja legalizado, é preciso que isso aconteça logo, antes que ocorram mais tragédias. E, junto com a legalização, uma maior educação sexual, que falta em nosso país. Mais informações sobre o aborto e seus riscos, acompanhado de uma boa explicação sobre métodos anticoncepcionais e a importância de seu uso. Só assim teremos cada vez menos mulheres abortando, e não mais. Pelo menos, acredito eu. E defendo. Quem deve decidir sobre o corpo da mulher é ela, não o governo, nem ninguém. Então, quem deve decidir sobre abortar é a mulher. A vida que está em jogo, nesse momento, é dela. E é ela quem deve decidir se quer colocar no mundo mais uma vida para estar em jogo.

Marina Martins