Infelizmente,
eu não fui aos protestos que tiveram na semana passada. Na segunda-feira, após
dar aula em um pré-vestibular, fui encontrar com meu pai para jantar. Marcamos uma
hora, mas ele me disse que chegaria depois, porque não estava conseguindo pegar
o metrô. Quando nos encontramos, ele me explicou que havia uma multidão perto
do metrô da Uruguaiana, que é o que ele pega para voltar do trabalho. Ele me
disse que passou no meio das pessoas e que só via fumaça de gás lacrimogêneo – inclusive
ela o atingiu e deixou seu olho ardendo – ouvia barulhos de bombas de efeito
moral e via também pessoas sendo agredidas e presas. Eu disse a ele “e eu
pensei em ir, pai...”. Ele me respondeu, com uma expressão assustada, “imagina!”.
Meu
pai tem mais de sessenta anos e, na época da Ditadura, era de esquerda, ou
seja, lutava por um país melhor. Hoje, em plena democracia, ele se assustou e
teve medo da filha dele estar em meio a um protesto pela justiça nos preços dos
ônibus. Estou falando isso porque a época da Ditadura foi conturbada e
violenta, em termos políticos. Hoje, vivemos numa democracia em que temos de
ter medo ao pedir pacificamente por melhores preços. Quinta-feira, não fui à
manifestação. Até porque, além do medo da violência exercida por uma minoria
imbecil de manifestantes (isso inclui pichações em patrimônios culturais) e
pelos policiais, fico nervosa em locais com muitas pessoas. Ou seja, eu não
conseguiria correr, se precisasse; não seria uma boa ideia.
Hoje,
eu queria ir, mas não posso. No horário do protesto estarei dando aula e eu não
deixo meus alunos na mão. Dou aula para um pré-vestibular comunitário, ajudando
a levar cultura e conhecimento a pessoas que não tiveram as mesmas
oportunidades de educação que eu tive. Espero que eu esteja conseguindo. Fiquei
bastante satisfeita com os resultados no ano passado – não me refiro às notas,
me refiro à gratificação de alguns por poderem ter essas aulas. Estou também satisfeita
esse ano. O que vejo é um grupo de jovens e adultos que querem passar no
vestibular e estudar; eles participam, me ajudam, me corrigem, me ensinam. O ensinamento
nas aulas é recíproco, nós nos ajudamos. Falei isso tudo para dizer que eu
queria, sim, ir às ruas hoje para ajudar a mudar o país, mas estarei tentando
mudá-lo de outra forma. No horário em que amigos meus, até alunos meus, e
outras pessoas estarão protestando pela justiça, eu estarei tentando mudar a
educação injusta desse país, fazendo o que posso para isso.
Marina Martins, que está vestindo branco, em homenagem aos protestos.