domingo, 28 de dezembro de 2014

Daqueles de fim de ano



Não é a toa que escrevo. Escrevo porque tenho muito a pensar e pouco consigo dizer. Escrevo porque quando tento falar, os pensamentos se embaralham e ficam presos, se confundem, enrolam minha língua e me deixam com vontade de chorar, porque é muita coisa junta. Quando as memórias, os medos e as esperanças se misturam na minha cabeça, elas escorrem pelos meus olhos. Já estou acostumada. Então, se tento falar, as coisas demoram a sair e escapam entre soluços. Tais soluços prendem aquele choro que é fruto de tanta informação para um só mente. Uma mente talvez tão aberta, que deixa escapar os sentimentos. Mas talvez um pouco fechada a ponto de acorrentar alguns outros.

 

A minha família gosta muito de falar. Então, em nossos Natais nós sempre falamos bastante, rimos muito e choramos também. Porque a ausência da minha avó se encontra muito presente neles e as lágrimas são inevitáveis. Enfim. Nesse Natal, uma das minhas tias deu ideia de que falássemos uma conquista do ano de 2014 – que não foi fácil para ninguém – e algo que poderíamos melhorar. É daí que surge esse meu texto, provavelmente o último do ano. Ano passado eu escrevi um sobre a mania de dizer “último do ano” para tudo o que será realmente o último do ano, então fiz questão de repetir isso!

 

Enquanto outras pessoas falavam sobre seus anos e eu as escutava, ao mesmo tempo os meus pensamentos vinham à cabeça. E, claro, misturavam-se. Eu tenho a mania de, de vez em quando, tentar construir as frases antes de dizê-las, exatamente por esse motivo. Às vezes, se eu não as construo, elas nem saem. Enquanto eu montava uma, vinha outra na cabeça, e outra, e mais outra e assim por diante. Quando pedi a palavra, eu comecei dizendo: é por isso que escrevo. Eu nem tinha começado a falar e já estava com vontade de chorar, por serem tantas as coisas que me vinham em mente naquele momento. E disso se desencadeia uma qualidade minha, mas também um defeito: ser muito intensa. Então, de início, isso é algo que pretendo melhorar. Essa intensidade louca me faz viver as coisas de forma enorme, só que isso às vezes me causa angústias profundas e grandes preocupações com coisas que não merecem tanta importância. Por isso choro tanto. Essa intensidade me dá dores na cabeça, na barriga, me estressa e me entristece. Como disse nesse meu último texto do ano passado, nós, os seres humanos, temos a mania de nos dar metas conforme muda o ano. Gente, muda o ano e, na verdade verdadeira, é só mais um novo dia. Mas já que nós atribuímos tanta importância a este tal primeiro dia do novo ano, eu entro na onda e digo para mim mesma: em 2015, quero aprender a ser menos intensa. É claro que também tem a deliciosa parte dessa intensidade, que é a maneira como vivo a vida, olho o mundo. Ela me desencadeia memórias maravilhosas – muitas delas são as que futuramente me farão chorar em momento exclusivo delas ou embaralhadas com outras. Mas de qualquer jeito, espero ser menos intensa no sentido ruim do termo. Sem mais dores de cabeça e barriga por situações não tão difíceis assim!

 

Também contei de algo que me aflige de vez em quando: minha profissão. Escolher ser cineasta não é para qualquer um. Não estou me colocando acima de ninguém, porque escolher engenhariamedicinadireitopsicologiaveterináriaeconomiadesignetc também não é para qualquer um. Mas vou falar do meu caso, porque é dele que melhor sei falar. Tem que ter amor e coragem pela decisão, porque não é uma carreira fácil. E eu canso de escutar isso. Todos fazem questão de me dizer. Sim, gente, eu já sei. Ninguém escolhe uma carreira na área artística buscando única e exclusivamente ganhar dinheiro. E é essa dificuldade toda que mais me preocupa. Às vezes sinto medo de nada dar certo. Sinto medo de sonhar grande demais e acabar pequena. Sinto medo de rir das expectativas que tinha no passado e pensar “nossa, como eu era ingênua”. Eu amo o que escolhi e acho lindo, mas não é nada que me deixe segura. E essa tal intensidade que falei também se mistura com uma forte característica minha: ser sonhadora. Eu nasci de uma família muito artista. A gente tem muita arte dentro da gente. Por isso, somos tão sonhadores e intensos – eu não poderia ter vindo diferente. Que bom.

 

Mas às vezes esse meu medo todo se conforta quando ouço belas palavras de pessoas queridas. Aqui, queria citar uma delas. Durante o amigo oculto, minha prima de 11 anos se levantou na sua vez de dar o presente e disse: vou falar uma coisa só e vocês já vão adivinhar. A pessoa que eu tirei vai ser uma grande cineasta. Pronto, isso bastou. Foi tão lindo ouvir isso de alguém tão mais novo! Aquilo me emocionou de uma maneira doida, porque eu vi que ela imagina a prima dela como grande. Ela me vê como alguém que tem potencial para alcançar o maior sonho. Palavras como as dela me fazem seguir sonhando. E para quem não entende porque sou tão obsecada por Amélie Poulain, deixo aqui um motivo simples: da primeira vez que assisti ao filme, ele me conquistou (mais ainda) com uma frase: “os tempos são duros para os sonhadores”. E sabe por quê? Porque a gente é muito intenso! E sem a intensidade da qual tanto reclamei, é difícil persistir nos sonhos. A graça é sonhar grande, enquanto vou realisando outros sonhos menores. Viver sem sonhos é chato. Eu não teria no que pensar nas horas de tédio, intelectualidade, sono, monotonia, enfim. Eu não teria essa válvula de escape mental. Mais uma meta para 2015: seguir sonhando.

 

Enquanto eu dizia tudo isso, entre lágrimas, choros e soluços, os olhos de toda a minha família me escutavam. Eles me olhavam lindamente, com expressões deliciosas no rosto, de quem ouve e entende. De quem se vê no que escuta. De quem se identifica. De quem atenta e quem se interessa. [Afinal, o que é o cinema, senão uma arte que mistura tudo isso?] No final da minha loucura, eles aplaudiram, enquanto sorriam para mim. Eles me sentiram. Aquilo foi tão lindo que saí logo pensando no texto que escreveria. É claro que quatro dias depois, todos os pensamentos se hgsdcgewruydjnaj nessa minha cabeça doida e sonhadora, então espero ter conseguido transformá-los em letras digitadas. Pelo menos, creio que foi uma tarefa mais fácil do que transformá-los em palavras ditas em meio a tantas lágrimas e risos. Um 2015 de muitos sonhos e momentos intensos para todos nós. Saravá!

Marina N. Martins

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

339



Choro

A transição
E a tensão
Entre a garganta
E os olhos.

Marina Martins

338



-in

Será

Que quando seus olhos fecham

Eles também me enxergam?

Será

Que seus devaneios

Também se confundem em sono

Também se confundem em sonho

E te fazem dormir bem?

Marina Martins