Não
é a toa que escrevo. Escrevo porque tenho muito a pensar e pouco consigo dizer.
Escrevo porque quando tento falar, os pensamentos se embaralham e ficam presos,
se confundem, enrolam minha língua e me deixam com vontade de chorar, porque é
muita coisa junta. Quando as memórias, os medos e as esperanças se misturam na
minha cabeça, elas escorrem pelos meus olhos. Já estou acostumada. Então, se
tento falar, as coisas demoram a sair e escapam entre soluços. Tais soluços
prendem aquele choro que é fruto de tanta informação para um só mente. Uma mente
talvez tão aberta, que deixa escapar os sentimentos. Mas talvez um pouco
fechada a ponto de acorrentar alguns outros.
A
minha família gosta muito de falar. Então, em nossos Natais nós sempre falamos
bastante, rimos muito e choramos também. Porque a ausência da minha avó se
encontra muito presente neles e as lágrimas são inevitáveis. Enfim. Nesse Natal,
uma das minhas tias deu ideia de que falássemos uma conquista do ano de 2014 –
que não foi fácil para ninguém – e algo que poderíamos melhorar. É daí que
surge esse meu texto, provavelmente o último do ano. Ano passado eu escrevi um
sobre a mania de dizer “último do ano” para tudo o que será realmente o último
do ano, então fiz questão de repetir isso!
Enquanto
outras pessoas falavam sobre seus anos e eu as escutava, ao mesmo tempo os meus
pensamentos vinham à cabeça. E, claro, misturavam-se. Eu tenho a mania de, de
vez em quando, tentar construir as frases antes de dizê-las, exatamente por
esse motivo. Às vezes, se eu não as construo, elas nem saem. Enquanto eu
montava uma, vinha outra na cabeça, e outra, e mais outra e assim por diante. Quando
pedi a palavra, eu comecei dizendo: é por isso que escrevo. Eu nem tinha começado
a falar e já estava com vontade de chorar, por serem tantas as coisas que me vinham
em mente naquele momento. E disso se desencadeia uma qualidade minha, mas
também um defeito: ser muito intensa. Então, de início, isso é algo que
pretendo melhorar. Essa intensidade louca me faz viver as coisas de forma
enorme, só que isso às vezes me causa angústias profundas e grandes
preocupações com coisas que não merecem tanta importância. Por isso choro
tanto. Essa intensidade me dá dores na cabeça, na barriga, me estressa e me entristece.
Como disse nesse meu último texto do ano passado, nós, os seres humanos, temos
a mania de nos dar metas conforme muda o ano. Gente, muda o ano e, na verdade
verdadeira, é só mais um novo dia. Mas já que nós atribuímos tanta importância
a este tal primeiro dia do novo ano, eu entro na onda e digo para mim mesma: em
2015, quero aprender a ser menos intensa. É claro que também tem a deliciosa
parte dessa intensidade, que é a maneira como vivo a vida, olho o mundo. Ela me
desencadeia memórias maravilhosas – muitas delas são as que futuramente me
farão chorar em momento exclusivo delas ou embaralhadas com outras. Mas de
qualquer jeito, espero ser menos intensa no sentido ruim do termo. Sem mais
dores de cabeça e barriga por situações não tão difíceis assim!
Também
contei de algo que me aflige de vez em quando: minha profissão. Escolher ser
cineasta não é para qualquer um. Não estou me colocando acima de ninguém,
porque escolher engenhariamedicinadireitopsicologiaveterináriaeconomiadesignetc
também não é para qualquer um. Mas vou falar do meu caso, porque é dele que
melhor sei falar. Tem que ter amor e coragem pela decisão, porque não é uma
carreira fácil. E eu canso de escutar isso. Todos fazem questão de me dizer. Sim,
gente, eu já sei. Ninguém escolhe uma carreira na área artística buscando única
e exclusivamente ganhar dinheiro. E é essa dificuldade toda que mais me
preocupa. Às vezes sinto medo de nada dar certo. Sinto medo de sonhar grande demais
e acabar pequena. Sinto medo de rir das expectativas que tinha no passado e
pensar “nossa, como eu era ingênua”. Eu amo o que escolhi e acho lindo, mas não
é nada que me deixe segura. E essa tal intensidade que falei também se mistura
com uma forte característica minha: ser sonhadora. Eu nasci de uma família
muito artista. A gente tem muita arte dentro da gente. Por isso, somos tão
sonhadores e intensos – eu não poderia ter vindo diferente. Que bom.
Mas
às vezes esse meu medo todo se conforta quando ouço belas palavras de pessoas
queridas. Aqui, queria citar uma delas. Durante o amigo oculto, minha prima de
11 anos se levantou na sua vez de dar o presente e disse: vou falar uma coisa
só e vocês já vão adivinhar. A pessoa que eu tirei vai ser uma grande cineasta.
Pronto, isso bastou. Foi tão lindo ouvir isso de alguém tão mais novo! Aquilo me
emocionou de uma maneira doida, porque eu vi que ela imagina a prima dela como
grande. Ela me vê como alguém que tem potencial para alcançar o maior sonho. Palavras
como as dela me fazem seguir sonhando. E para quem não entende porque sou tão
obsecada por Amélie Poulain, deixo aqui um motivo simples: da primeira vez que
assisti ao filme, ele me conquistou (mais ainda) com uma frase: “os tempos são
duros para os sonhadores”. E sabe por quê? Porque a gente é muito intenso! E sem
a intensidade da qual tanto reclamei, é difícil persistir nos sonhos. A graça é
sonhar grande, enquanto vou realisando outros sonhos menores. Viver sem sonhos
é chato. Eu não teria no que pensar nas horas de tédio, intelectualidade, sono,
monotonia, enfim. Eu não teria essa válvula de escape mental. Mais uma meta
para 2015: seguir sonhando.
Enquanto
eu dizia tudo isso, entre lágrimas, choros e soluços, os olhos de toda a minha
família me escutavam. Eles me olhavam lindamente, com expressões deliciosas no
rosto, de quem ouve e entende. De quem se vê no que escuta. De quem se
identifica. De quem atenta e quem se interessa. [Afinal, o que é o cinema, senão uma arte que mistura tudo isso?] No
final da minha loucura, eles aplaudiram, enquanto sorriam para mim. Eles me
sentiram. Aquilo foi tão lindo que saí logo pensando no texto que escreveria. É
claro que quatro dias depois, todos os pensamentos se hgsdcgewruydjnaj nessa
minha cabeça doida e sonhadora, então espero ter conseguido transformá-los em
letras digitadas. Pelo menos, creio que foi uma tarefa mais fácil do que transformá-los
em palavras ditas em meio a tantas lágrimas e risos. Um 2015 de muitos sonhos e
momentos intensos para todos nós. Saravá!
Marina N. Martins