“Na PUC só tem cuzão”; “desprezo”; “PUC vai se foder”;
“toda puquiana dá o cú e mama e senta no piru”. Algumas das coisas que eu soube
e li que foram ditas nos JUCS (Jogos Universitários de Comunicação Social).
Não, eu não fui ao evento, pelo simples motivo de que não é o tipo de evento
que me atrai. Mas quando fiquei sabendo que houve denúncias de ESTUPRO, outros
tipos de violência, além dos tristemente óbvios machismo, racismo e homofobia,
decidi entrar na página “Spotted: JUCS”. Eu estou enjoada, com dor de cabeça e
com choro preso. Alguns podem achar que sou sensível demais, chata, ridícula e
eu não me importo. Eu só fico assim porque sei que esse tipo de coisa que
acontece nesses JOGOS é errado, feio, triste ou até crime. Então a minha reação
não me assusta. O que me assusta são as pessoas que tomam as atitudes que me
machucam, mesmo eu não estando perto. Aliás, isso é o que mais vem acontecido
ultimamente. Praticamente todos os dias eu fico triste por atos que não
presencio, mas são como se me dessem um tapa na cara. Ou um soco no estômago.
Enfim, nessa página, alguém reclamou, anonimamente,
de uma torcida que chamava as jogadoras adversárias de “puta feia”, “piranha”.
A pessoa citou uma torcida, mas imagino que isso não ocorra só em uma. E depois
falou de outra que se proclamava “só moleque estuprador”. No post, comentários
como “se não gostou, vai pra igreja”, “gritei o jogo inteiro ‘gay’, ‘dá cu’”, “vai
pra JMJ”, “não fode feminista chata do caralho”. Tais comentários feitos por
homens e, pasmem, mulheres. Ah sim! E uma hashtag “turma do estupro”,
acompanhada de um comentário “ano que vem vai ser pior”.
Vamos lá, por partes. Eu sou estudante da PUC com muito
orgulho. Conheço muita gente bacana lá que está longe de ser “cuzão”. Generalizar
os estudantes da PUC como ricos, segregacionistas, patricinhas e playboys preconceituosos
está errado. Isso é preconceito. Eu adoro a minha faculdade e não me sinto
representada por esse tipo de pessoas. E tenho certeza de que muita gente
partilha da mesma opinião. Desculpa se eu estudo na PUC. Desculpa se eu não
passei pra UFRJ e nem pra UFF. Desculpa se, se eu tivesse passado para a UFRJ,
faculdade que acho incrível, eu não iria porque não tem curso de cinema (coisa
que sempre quis que tivesse para eu poder tentar estudar lá). Desculpa se, se
eu tivesse passado pra UFF, eu continuaria em dúvida entre ela e a PUC porque
sempre tive um carinho enorme pela minha faculdade. Desculpa por estudar em uma
faculdade particular e não me enquadrar num elitismo escroto. Desculpa por
gostar muito do campus da PUC e dxs amigxs e colegas que fiz lá. Desculpa por
dizer que gente escrota existe em qualquer faculdade. Que sorte a minha de
poder estudar numa faculdade tão bonita, com tantos eventos legais e que, como
todas, tem seus problemas. E que pena que ela seja representada nos Jogos por uma minoria preconceituosa que canta alto músicas racistas e elitistas. Universidades, faculdades e escolas superiores
existem, se superam em alguns cursos, outros não, às vezes todos, têm mais e menos
problemas, são públicas e particulares, são diferentes. E que bom que existem
para – espera-se – formar bons intelectuais e profissionais. Que triste essa
guerrinha entre faculdades. Que triste luta de classes. Que triste a desunião
dos jovens universitários. Isso não é uma competição.
Mais cedo ou mais tarde, quem xinga e quem é xingado
se cruzará no mercado de trabalho, nas agências, redações e produtoras da vida.
Fico pensando que, se em jogos se tratam assim, como será que vai ser no trabalho?
Acho que o jovem que hoje exalta o estupro e se orgulha de – ai que nojo de
escrever isso – ser um estuprador, será o chefe que vai escolher as
funcionárias pelo corpo e tentar comer elas (sim, com esse linguajar) através
de chantagens ou ofertas melhores no emprego. Ou ‘pelo menos’ o chefe que vai
dar cantadas diariamente nas funcionárias. Ou pior: estuprá-las. O jovem de
hoje que ‘xinga’ alguém de gay – “xingar” e “gay” não cabem numa mesma frase
para mim – será aquele que, na hora de contratar, não vai gostar da voz
afeminada daquele profissional incrível e vai discriminar o outro porque é
casado com um homem. O jovem de hoje que faz uso de xingamentos racistas vai
ser aquele que vai preferir contratar o branco sem nenhuma experiência do que o
negro com um currículo incrível. Que vai preferir alguém só porque é rico do
que alguém que é pobre. Que tristeza.
Que tipo de juventude é essa que acha que orientação
sexual, gênero, cor e tipo físico é xingamento? Que tipo de juventude é essa
que não consegue participar de competições sem que haja troca de agressões
verbais e físicas, violências psicológicas, físicas e sexuais? Que juventude é
essa que vive em constante troca de ofensas, em constante luta de classes,
generalização, pré-conceitos, preconceitos e desunião? São alguns desses os
futuros geradores de mídias, entretenimentos. Fora os futuros advogados e
médicos que também gostam de ofender nos Jogos Júridicos e nos de Medicina. Que
juventude é essa? Nossa, estamos em 2015, e eu querendo voltar no tempo para
ser jovem nos anos 60, 70, 80, até 90! Basta ver os protestos das Diretas Já! e dos
Cara Pintada. Várias pessoas de diversas idades unidas, lutando todas pelo bem
delas e de seu povo, pensando no melhor para sua sociedade. E aqui estamos
hoje, repito, em 2015, tendo que ouvir XINGAMENTOS como preto, pobre, sapata,
viado, puta, piranha e por aí vai. Será que os jovens se tornam mais conservadores à medida que o tempo passa? Qual o sentido disso? Que juventude é essa que ainda xinga com
essas palavras? Na boa, quem são vocês? Quem somos nós? Quem é a maioria? Quem nos
representa? Quem é quem?
Diante disso tudo, fui pegar o metrô hoje e coloquei
meu iPod, para tentar me desligar do mundo. Coincidência ou não, apertei no
shuffle e começou a tocar a música “Don’t let it bring you down” (Não deixe isso
te deprimir), do Neil Young. Poderia ser uma cena de filme com a trilha sonora
perfeita, mas foi real. Eu acabei de ler a tradução da música e me assustei com
a coincidência. Deve ter sido o mundo, tão louco, me passando uma mensagem. Essa
não é a juventude, futuros adultos profissionais, que quero trabalhar e
conviver na minha vida. Esses xingamentos não me representam. Então, para quem
sente a minha dor e tristeza diante de tudo isso, e até mais, repasso a
mensagem que me foi enviada por uma energia maior, ou por uma incrível
coincidência dada pelo meu iPod: “não deixa que isso te deprima, são apenas
castelos queimando, encontre alguém que está mudando, que você dará a volta por
cima”. Não deixemos que isso nos deprima. Algum dia –ah! ALGUM DIA! – nós daremos
a volta por cima.
Marina N. Martins