segunda-feira, 31 de março de 2014

Mais um outro de machismo.



O título é esse porque já tenho um texto chamado “Mais um de machismo”. Já que me estresso constantemente com essa palhaçada, tenho vários textos sobre o assunto e tudo o que está relacionado a ele. Com toda essa campanha contra estupro, depois da pesquisa que saiu, não podia ser diferente. Aqui estou eu, escrevendo mais um outro de machismo. Hoje de manhã, ao entrar no Facebook, já me estressei com uma imagem:







Queria dizer que há uma diferença tremendamente grande entre moda e campanha. Gostaria de saber desde quando lutar pelos direitos (mais básicos) da mulher é uma modinha. Por favor, né! Se uma CAMPANHA dessas existe, é porque, infelizmente, tem um motivo. E que bom que várias mulheres (e homens) estão participando dela, postando fotos dizendo algo extremamente simples, óbvio e básico: Ninguém merece ser estuprada. Também queria dizer que, se alguma mulher diz que homens bonitos podem estuprá-la, essa mulher tem sérios problemas psicológicos e sexuais. Não interessa se é bonito ou feio: se forçou, já não pode. Até porque, se você quer que alguém te estupre, é porque você quer transar com essa pessoa. Essa frase é burra e não faz sentido. Ninguém quer fazer nada a força. Ninguém quer comer o que não gosta. Ninguém quer estudar o que detesta. Ninguém quer transar com quem não sente vontade. Simples assim. Não entendo a dificuldade de certas pessoas de entenderem isso.



Mulher nenhuma facilita estupro. Se há mulheres que gostam de fazer sexo com várias pessoas diferentes por dia e ao mesmo tempo, isso é um direito delas. Mas como já falei, no momento em que alguém é forçada, não é mais direito nenhum de ninguém. O fato de uma mulher usar fio dental na praia não quer dizer que ela quer se mostrar para os homens. Já parou pra pensar que ela pode estar com a autoestima lá em cima e acha a bunda dela linda? Se uma mulher anda de shortinho enfiado no bumbum, isso não quer dizer que ela está dando a entender nada. Se você acha isso vulgar, ok. Mas em hipótese nenhuma isso é motivo para achar que ela quer ser abusada. Muitas vezes, a mulher se veste para ela e não para quem vai cruzar com ela na rua.



Roupa não faz diferença. Quando estou de calça jeans, homens mexem comigo. Quando estou de vestido longo, homens mexem comigo. Quando estou de saída de praia, homens mexem comigo. Quando estou saindo da ioga, homens mexem comigo. Quando estou de moletom, homens mexem comigo. Se eu me vestir de homem, homens vão mexer comigo. Não importa o que estou vestindo, vou atrair olhares indesejados de homens na rua, que não têm o menor respeito para com as mulheres. São os homens que acham que a gente gosta de ficar ouvindo “psiu”, “fiufiu”, “gostosa”, ou, como já aconteceu comigo “se tu fosse minha namorada, não saía da cama nunca”. Alguém acha que me senti bem ouvindo isso? Eu quase chorei de raiva. A minha vontade era de voar em cima do cara e dar um chute certeiro nele. Mas não disse nada. Tive medo.



Medo. É assim que a gente anda na rua. A gente tem medo de reagir quando mexem com a gente. A gente tem medo de sentar do lado de homens no ônibus. Eu tenho medo de pedir para um homem sair do vagão feminino no metrô. Tenho medo de receber entrega quando estou sozinha em casa. Tenho medo de discutir com taxista machista. Minha mãe tem medo que eu pegue ônibus de short curto, porque vou chamar atenção. Olha isso! Eu tenho que ter MEDO de sair de short porque os homens vão me respeitar menos. E o pior disso tudo: vão mesmo. Eu já troquei minha roupa porque me senti insegura. Já estiquei a saia porque o cara do meu lado tava olhando. Já troquei de lugar porque o cara me perguntou as horas enquanto olhava para minha coxa. Um dos meus maiores medos é ser estuprada e isso não ta certo. As meninas e mulheres não têm que andar na rua com medo de serem tocadas e chamadas por quem não querem. Por pessoas sem respeito, educação e noção. Por tarados, pervertidos e doentes. Nesse texto, citei algumas situações pelas quais passei e afirmo que muitas e muitas mulheres passam por isso diariamente. Até hoje, não conheci nenhuma que goste.



Desejo, do fundo do meu coração, que essa palhaçada de jogar a culpa na mulher acabe. Que na próxima pesquisa, esse bando de incompetentes e ignorantes respondam que, EM NENHUMA HIPÓTESE, a vítima tem culpa. De nada! Ninguém pede pra ser assaltada por falar no celular, assim como ninguém pede pra ser estuprada quando usa roupa curta. Ou biquíni. Ou calcinha. Ou cueca. Ou burca. Ou pano. Ou véu. Ou manta. Ou qualquer coisa. A culpa não é nossa. E vivam os feministas e as feministas que apoiam as mulheres na luta por nossos direitos, em pleno ano de 2014. De burca ou roupa rasgada, ninguém merece ser estuprada.

Marina Martins

quarta-feira, 12 de março de 2014

Josés.

Texto escrito baseado na imagem abaixo, para a aula de Técnicas de Comunicação. Era um concurso para ganhar meio ponto. Não ganhei, mas acabei gostando do textinho, então resolvi compartilhar.



Havia passado a noite jogado em um canto, com uma garrafa vazia de 51 e uma sacola debaixo da cabeça, fazendo-a de travesseiro. Não acordou assim que o sol apareceu. Resmungou e colocou a sacola em cima dos olhos, para espantar a claridade. Conseguiu dormir por mais ou menos uma hora. Quando o sol começou a incomodar, levantou-se e começou a andar, cambaleando de sono e bebida. Procurando onde sentar, encontrou um banco onde tinha um homem sentado.

- Se o senhor me dá licença, vou me sentar um pouquinho. É que to cansado, sabe? Corpo cansado, cabeça cansada, em mim ta tudo cansado. E o senhor, cansou também? Ta aí desde ontem... eu to também. Tava encostado ali nas pedras, o senhor deve ter visto. Eu sempre encontro uma “pedra no meio do caminho” para me acolher quando to mal, sabe? O senhor deve ta se perguntando: “se esse desgraçado passou a noite inteira deitado, como é que pode ta cansado?”. Pois é... é que além de cansado, eu to triste, sabe. Meu dia ontem não foi fácil. O senhor deve ta pensando “isso só pode ser por causa de mulher...”. E não é que é mesmo, seu... seu... Como é que é teu nome heim?

Sem obter alguma resposta, decidiu continuar falando mesmo assim.

- Já que o senhor não responde, eu vou te dar um nome. Posso te chamar de José? O senhor tem mó cara de José. Aliás, me chamo Carlos. Prazer, seu José. Olha só, eu tava falando que tava triste por causa de mulher né? Pois é. Mas não é qualquer mulher não, seu José. É minha mãe. Perdi ela anteontem. Aí ontem, depois do enterro, fui pra casa. Botei um trapo qualquer, desisti de dormir, saí na rua. Bebi que nem um condenado, já passou a noite e eu continuo bêbado. To sujo, to fedendo, mas é porque to triste. Me responde, seu José, “por que Deus permite que as mães vão-se embora”? “Mãe é eternidade”, seu José. “Por que Deus se lembra de tirá-la um dia?” Minha mãe era tudo pra mim. Me apoiava em tudo o que eu fazia, seu José. Quando eu tava desempregado, me ajudou a achar emprego. Ela era faxineira, conseguiu me colocar de porteiro em um prédio perto do que ela trabalhava. Provavelmente to desempregado de novo. Não apareci ontem no trabalho, não atendi o telefone. Não sei nem onde é que ta meu telefone, seu José. Acontece que, sem minha mãe, acho que não sou ninguém. Eu morava com ela até hoje, sabe? E era o único filho. Meus irmãos não estão mais com a gente. Um morreu, outra sumiu. Aí né, a mulher vai e infarta. Minha mãe. Infartou! No meio da faxina, morreu. Quando soube da notícia, pensei em me matar junto com ela, mas não matei não. Tentei ser forte. Mas fiquei fraco. Mas morrer, não morri. Sabe de uma coisa, seu José? “Se eu fosse Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca”. O senhor já perdeu sua mãe, seu José? Já, né? É muito triste, não é? Não sei o que vai ser de mim agora. Meu apoio foi embora... “E agora, José?” Que que eu faço da minha vida? Não tenho mulher, não devo mais ter emprego, não tenho mais mãe... Vou chegar pra procurar emprego todo mal vestido, carregando sacola? Alguém vai me escolher? Preto, pobre, favelado... não é isso que o Brasil quer. O Brasil quer alguém assim como o senhor; roupa engomada, sapato arrumado, óculos no rosto e livrinho na mão. Eu nunca li nenhum livro, seu José. É muito difícil ser pobre no Brasil, seu José, muito difícil. Vou ver se vou pra casa tomar um banho. Posso te pedir uma coisa, seu José? Reza por mim. Eu rezo pelo senhor também. Desculpe ter te incomodado, mas obrigado pela sua atenção. Quem sabe a gente não se cruza de novo, né não seu José?

No dia seguinte, Carlos descobriu que não tinha perdido o emprego e que, fazendo força, conseguiria viver sem sua mãe. A caminho do trabalho, resolveu saltar antes e caminhar pela orla de Copacabana. Estava tão bêbado e angustiado no dia anterior, que nem lembrou-se de sua conversa com a estátua do poeta. Viu a estátua, achou bonita e continuou a andar com seu uniforme azul. Carlos era só mais um José.

Marina Martins

326

Ange ou Démon

Você é um anjo
ou uma assombração?
Os cabelos louros...
os olhos azuis...
Aparência?
Enganação?

As vontades de vê-lo,
as outras de matá-lo,
de vê-lo para beijá-lo,
de vê-lo para dar-lhe tapas!

Aquele que me desconcerta
e faz as rimas saírem imperfeitas.
Versos soltos, descombinados,
diferentes daqueles primeiros...
lembra?
Você nem leu.
Não te mostrei.
Não entenderia.

Suas rimas se foram
para um outro
e para o outro,
quiçá quantos outros,
quantas outras
amigas
outros
amantes
outros
amores...
(Ainda consigo fazê-las?)

Pode aparecer nos meus sonhos,
anjo.
Mas pare de me
assombrar.

Marina Martins