Texto escrito baseado na imagem abaixo, para a aula de Técnicas de Comunicação. Era um concurso para ganhar meio ponto. Não ganhei, mas acabei gostando do textinho, então resolvi compartilhar.
Havia passado a noite jogado em um canto, com uma garrafa vazia de 51 e
uma sacola debaixo da cabeça, fazendo-a de travesseiro. Não acordou
assim que o sol apareceu. Resmungou e colocou a sacola em cima dos
olhos, para espantar a claridade. Conseguiu dormir por mais ou menos uma
hora. Quando o sol começou a incomodar, levantou-se e começou a andar,
cambaleando de sono e bebida. Procurando onde sentar, encontrou um banco
onde tinha um homem sentado.
- Se o senhor me dá licença, vou me sentar um pouquinho. É que to cansado, sabe? Corpo cansado, cabeça cansada, em mim ta tudo cansado. E o senhor, cansou também? Ta aí desde ontem... eu to também. Tava encostado ali nas pedras, o senhor deve ter visto. Eu sempre encontro uma “pedra no meio do caminho” para me acolher quando to mal, sabe? O senhor deve ta se perguntando: “se esse desgraçado passou a noite inteira deitado, como é que pode ta cansado?”. Pois é... é que além de cansado, eu to triste, sabe. Meu dia ontem não foi fácil. O senhor deve ta pensando “isso só pode ser por causa de mulher...”. E não é que é mesmo, seu... seu... Como é que é teu nome heim?
Sem obter alguma resposta, decidiu continuar falando mesmo assim.
- Já que o senhor não responde, eu vou te dar um nome. Posso te chamar de José? O senhor tem mó cara de José. Aliás, me chamo Carlos. Prazer, seu José. Olha só, eu tava falando que tava triste por causa de mulher né? Pois é. Mas não é qualquer mulher não, seu José. É minha mãe. Perdi ela anteontem. Aí ontem, depois do enterro, fui pra casa. Botei um trapo qualquer, desisti de dormir, saí na rua. Bebi que nem um condenado, já passou a noite e eu continuo bêbado. To sujo, to fedendo, mas é porque to triste. Me responde, seu José, “por que Deus permite que as mães vão-se embora”? “Mãe é eternidade”, seu José. “Por que Deus se lembra de tirá-la um dia?” Minha mãe era tudo pra mim. Me apoiava em tudo o que eu fazia, seu José. Quando eu tava desempregado, me ajudou a achar emprego. Ela era faxineira, conseguiu me colocar de porteiro em um prédio perto do que ela trabalhava. Provavelmente to desempregado de novo. Não apareci ontem no trabalho, não atendi o telefone. Não sei nem onde é que ta meu telefone, seu José. Acontece que, sem minha mãe, acho que não sou ninguém. Eu morava com ela até hoje, sabe? E era o único filho. Meus irmãos não estão mais com a gente. Um morreu, outra sumiu. Aí né, a mulher vai e infarta. Minha mãe. Infartou! No meio da faxina, morreu. Quando soube da notícia, pensei em me matar junto com ela, mas não matei não. Tentei ser forte. Mas fiquei fraco. Mas morrer, não morri. Sabe de uma coisa, seu José? “Se eu fosse Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca”. O senhor já perdeu sua mãe, seu José? Já, né? É muito triste, não é? Não sei o que vai ser de mim agora. Meu apoio foi embora... “E agora, José?” Que que eu faço da minha vida? Não tenho mulher, não devo mais ter emprego, não tenho mais mãe... Vou chegar pra procurar emprego todo mal vestido, carregando sacola? Alguém vai me escolher? Preto, pobre, favelado... não é isso que o Brasil quer. O Brasil quer alguém assim como o senhor; roupa engomada, sapato arrumado, óculos no rosto e livrinho na mão. Eu nunca li nenhum livro, seu José. É muito difícil ser pobre no Brasil, seu José, muito difícil. Vou ver se vou pra casa tomar um banho. Posso te pedir uma coisa, seu José? Reza por mim. Eu rezo pelo senhor também. Desculpe ter te incomodado, mas obrigado pela sua atenção. Quem sabe a gente não se cruza de novo, né não seu José?
No dia seguinte, Carlos descobriu que não tinha perdido o emprego e que, fazendo força, conseguiria viver sem sua mãe. A caminho do trabalho, resolveu saltar antes e caminhar pela orla de Copacabana. Estava tão bêbado e angustiado no dia anterior, que nem lembrou-se de sua conversa com a estátua do poeta. Viu a estátua, achou bonita e continuou a andar com seu uniforme azul. Carlos era só mais um José.
- Se o senhor me dá licença, vou me sentar um pouquinho. É que to cansado, sabe? Corpo cansado, cabeça cansada, em mim ta tudo cansado. E o senhor, cansou também? Ta aí desde ontem... eu to também. Tava encostado ali nas pedras, o senhor deve ter visto. Eu sempre encontro uma “pedra no meio do caminho” para me acolher quando to mal, sabe? O senhor deve ta se perguntando: “se esse desgraçado passou a noite inteira deitado, como é que pode ta cansado?”. Pois é... é que além de cansado, eu to triste, sabe. Meu dia ontem não foi fácil. O senhor deve ta pensando “isso só pode ser por causa de mulher...”. E não é que é mesmo, seu... seu... Como é que é teu nome heim?
Sem obter alguma resposta, decidiu continuar falando mesmo assim.
- Já que o senhor não responde, eu vou te dar um nome. Posso te chamar de José? O senhor tem mó cara de José. Aliás, me chamo Carlos. Prazer, seu José. Olha só, eu tava falando que tava triste por causa de mulher né? Pois é. Mas não é qualquer mulher não, seu José. É minha mãe. Perdi ela anteontem. Aí ontem, depois do enterro, fui pra casa. Botei um trapo qualquer, desisti de dormir, saí na rua. Bebi que nem um condenado, já passou a noite e eu continuo bêbado. To sujo, to fedendo, mas é porque to triste. Me responde, seu José, “por que Deus permite que as mães vão-se embora”? “Mãe é eternidade”, seu José. “Por que Deus se lembra de tirá-la um dia?” Minha mãe era tudo pra mim. Me apoiava em tudo o que eu fazia, seu José. Quando eu tava desempregado, me ajudou a achar emprego. Ela era faxineira, conseguiu me colocar de porteiro em um prédio perto do que ela trabalhava. Provavelmente to desempregado de novo. Não apareci ontem no trabalho, não atendi o telefone. Não sei nem onde é que ta meu telefone, seu José. Acontece que, sem minha mãe, acho que não sou ninguém. Eu morava com ela até hoje, sabe? E era o único filho. Meus irmãos não estão mais com a gente. Um morreu, outra sumiu. Aí né, a mulher vai e infarta. Minha mãe. Infartou! No meio da faxina, morreu. Quando soube da notícia, pensei em me matar junto com ela, mas não matei não. Tentei ser forte. Mas fiquei fraco. Mas morrer, não morri. Sabe de uma coisa, seu José? “Se eu fosse Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca”. O senhor já perdeu sua mãe, seu José? Já, né? É muito triste, não é? Não sei o que vai ser de mim agora. Meu apoio foi embora... “E agora, José?” Que que eu faço da minha vida? Não tenho mulher, não devo mais ter emprego, não tenho mais mãe... Vou chegar pra procurar emprego todo mal vestido, carregando sacola? Alguém vai me escolher? Preto, pobre, favelado... não é isso que o Brasil quer. O Brasil quer alguém assim como o senhor; roupa engomada, sapato arrumado, óculos no rosto e livrinho na mão. Eu nunca li nenhum livro, seu José. É muito difícil ser pobre no Brasil, seu José, muito difícil. Vou ver se vou pra casa tomar um banho. Posso te pedir uma coisa, seu José? Reza por mim. Eu rezo pelo senhor também. Desculpe ter te incomodado, mas obrigado pela sua atenção. Quem sabe a gente não se cruza de novo, né não seu José?
No dia seguinte, Carlos descobriu que não tinha perdido o emprego e que, fazendo força, conseguiria viver sem sua mãe. A caminho do trabalho, resolveu saltar antes e caminhar pela orla de Copacabana. Estava tão bêbado e angustiado no dia anterior, que nem lembrou-se de sua conversa com a estátua do poeta. Viu a estátua, achou bonita e continuou a andar com seu uniforme azul. Carlos era só mais um José.
Marina Martins
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