Ela sentia-se como um pássaro preso em uma gaiola. Alias, sentia-se apenas em uma gaiola, já que não tinha asas, como um pássaro. Também não se sentia um leão em uma jaula, pois um leão mete medo às pessoas e ela, em seu atual estado, sentia medo das pessoas. Era como se ela fosse prisioneira do mundo e dela mesma. Vivia presa nas quatro paredes de seu quarto e seus sentimentos viviam presos entre das quatro paredes de seu corpo. E eles só escapavam de vez em quando, em forma de lágrimas. Essa não era a forma certa para eles saírem.
Naquela noite, chorava tanto que seus olhos negros pareciam escorrer como lágrimas. Mas era só a maquiagem. As lágrimas escuras e seus soluços altos competiam com a chuva forte que insistia em cair do lado de fora de sua gaiola. Ela odiava chuva, mas naquele momento só pensava em como seria bom voar para fora da gaiola e se molhar inteira com os pingos grossos que caíam freneticamente do céu. Mas não podia. Ela não tinha asas.
Aumentou a música que estava em contato com seus ouvidos e se abraçou deitada em sua cama. Fazia tempo que não amava. Não amava nada nem ninguém nos últimos meses. Só gostava. Pelo menos era o que ela sentia. Sentia falta de conjugar o verbo “amar” e se utilizar do substantivo ou adjetivo “amor”. Queria gritar. Tampou a boca com o travesseiro e gritou. Gritou muito. Sentiria pena se ele tivesse ouvidos, mas ele não tinha. No entanto, isso não bastava. Seus sentimentos continuavam presos, agora em uma fronha. Ela precisava sair, gritar alto, olhando para o alto, e engolir chuva. Deixar de se aprisionar. Mas afinal, o que ou quem a fazia ficar presa em sua gaiola? O que ou quem a impedia de abrir a porta e pegar chuva? Só ela. Ela a impedia de gritar, ela a impedia de sentir, ela a impedia de amar, ela a impedia de sair. Ela e nada ou ninguém mais.
Desligou a música um tanto alta e um tanto triste, engoliu de volta os gritos da fronha, limpou do rosto as linhas escuras desenhadas involuntariamente por suas lágrimas e encheu o peito. Antes de abrir a porta, se olhou no espelho e começou a novamente sentir amor por si mesma. Sorriu. Abriu a porta, fugiu da gaiola, saiu de casa, foi para o meio da rua e gritou. Gritou muito. Gritou alto, olhando para o alto e engoliu chuva. Quem viu a cena, pensou que estava maluca. E estava. Maluca de amar. Maluca de amor. Ela amava a vida, amava as pessoas e, naquele momento, amava até a chuva. Até porque, foi na chuva que gritou, se abraçou, sorriu e outra vez se amou.
Marina Martins
Um comentário:
curti mt, nina!
Postar um comentário