A imagem não é de Vênus, é a Lua feita por George Meliés, mas eu gosto muito dela. E acho que ela retrata como eu me sinto de vez em muito. |
"Na luta entre você e o mundo, apoie o mundo." - Franz Kafka
Eu gosto de escrever sobre o que me incomoda. Isso não tira o nó que fica na minha garganta e nem me livra de engasgos, mas pelo menos tira um pouco de peso da minha cabeça. Hoje, agora, muitas coisas estão reunidas dentro de mim e me dando dor no estômago. A quantidade sempre grande de propagandas machistas, que retratam a mulher como um corpo, a aprovação da proposta que reduz a maioridade penal e estudantes de medicina vestidos com roupas semelhantes às da Ku Klux Klan estão batendo na minha cabeça e me dando um enjoo terrível. Estão inclusive me atrasando no que eu deveria estar fazendo, mas não estou, porque preciso colocá-las para fora. Nem que seja através de letras.
Eu gosto de escrever sobre o que me incomoda. Isso não tira o nó que fica na minha garganta e nem me livra de engasgos, mas pelo menos tira um pouco de peso da minha cabeça. Hoje, agora, muitas coisas estão reunidas dentro de mim e me dando dor no estômago. A quantidade sempre grande de propagandas machistas, que retratam a mulher como um corpo, a aprovação da proposta que reduz a maioridade penal e estudantes de medicina vestidos com roupas semelhantes às da Ku Klux Klan estão batendo na minha cabeça e me dando um enjoo terrível. Estão inclusive me atrasando no que eu deveria estar fazendo, mas não estou, porque preciso colocá-las para fora. Nem que seja através de letras.
Vamos
começar por esses estudantes. Essas pessoas escolheram uma profissão que cuida
de pessoas. Da vida de pessoas. Com certeza, elas estudaram muito para poder
entrar na faculdade, pois passar para medicina não é uma tarefa fácil. Aí
resolvem fazer uma recepção de calouros em que suas fantasias são roupas
idênticas às usadas pelos membros da Ku Klux Klan (KKK). A única diferença é a
cor – de branca, mudou pra preta. Pra quem não sabe, a KKK foi uma seita
ocorrida nos Estados Unidos que defendia a supremacia branca, sendo
extremamente violenta com os negros e tendo como objetivos, exterminá-los.
Então não quero ver ninguém falando que o que esses estudantes fizeram foi uma
brincadeira, pois há momentos na história com os quais não se pode brincar. Há fantasias
que não podem ser reproduzidas. Há referências que só podem ser mencionadas
quando coberta de críticas. E esse caso é um deles. Me deixa extremamente
triste ver jovens fazendo “brincadeiras” de tanto mau gosto e tão violentas
como essa. Isso gera um pessimismo muito grande em mim, pois nós, jovens, somos
o próximo futuro ou o futuro próximo. E ter tantas pessoas que brincam com
coisas sérias assim ou que pensam de formas conservadoras me desestimula como
ser humano. A atitude desses estudantes me faz pensar em todos os podres que
existem na juventude atual e, nesse caso, só me resta lutar para um mundo
melhor. A parte boa disso tudo é que existem jovens que também pensam como eu. Isso
faz com que pelo menos um suspiro de otimismo respire dentro de mim.
Sobre
a redução da maioridade penal, que medida é essa? É inacreditável que acreditem
que colocar jovens de 16 anos na cadeia reduza a violência. Por favor, não é
colocando pessoas na cadeia que faz com que elas se redimam, muito menos no
Brasil. Todos sabemos como é nosso esquema carcerário; celas sujas e
superlotadas, pessoas suando juntas, passando mal de calor... não tem como
achar que isso vá tornar alguém um cidadão melhor. Creio que, em muitos casos,
a situação das cadeias enraivece mais ainda quem um dia já esteve lá. É desumano.
Eu até acho que há certos criminosos que merecem apodrecer em locais horríveis,
pois a partir do momento que alguém estupra, mata, essa pessoa está tirando o
direito humano da outra, então não acredito que ela mereça ser defendida
através desse mesmo direito. No entanto, não é o caso da maior parte de nossos
presos, principalmente tendo em vista que a maioria da população carcerária
nesse país é pobre e negra. Enquanto isso, ricos e políticos têm penas
reduzidas ou mais leves do que o apodrecimento em celas claustrofóbicas e
superlotadas.
Indo
agora para a questão do machismo, estou cada dia mais impressionada com as
peças publicitárias veiculadas nos meios de comunicação. A Revista Forum
publicou uma matéria com dez exemplos das propagandas mais preconceituosas do
último ano e, aqui, vou exemplificar três (duas delas também se encontram no link).
2.
A Verão da
Itaipava – vocês com certeza já viram essa. Se não viram, fiquem a vontade para quererem se matar comigo:
3. Nivea, apresentando
um creme contra celulites: a mulher pergunta “sabem por que estou me sentindo
tão confiante, por que me sinto tão bonita? Basta olhar para o meu bumbum”.
Parece
sacanagem, né gente? Mas não é. Isso existe. Isso é aprovado. Isso é transmitido.
Fico me perguntando quem são os responsáveis por criar e aprovar peças como
essas. E o pior é que tem gente que nem percebe a gravidade disso! A primeira
propaganda, além de machista, é completamente racista, pois todos sabem que as
mulheres negras não costumam ter cabelos naturalmente lisos. Então como dizer
que é isso o melhor delas? Como dizer que um cabelo é o que ressalta o melhor
de uma mulher? Por que o cabelo crespo é sempre chamado por algo pejorativo, é o cabelo ruim, bombril, pixaim? A segunda delas é só mais um dos inúmeros exemplos de
propagandas machistas de cerveja. Aqui, o verão é, na verdade, uma mulher “gostosona”,
que vive de biquíni pequeno ou sainha bem curtinha. O verão é reduzido a mulher
e cerveja. E a mulher é reduzida a um corpo. Como sempre. Sobre a da Nivea...
gente! Não preciso nem falar nada né? A mulher é tão nada, é tão só corpo, que
a confiança dela vem de uma bunda sem celulite. E ela convida para que todos
olhem sua bunda. E tal bunda é filmada o anúncio inteiro.
É
por causa desse tipo de coisa que a sociedade machista continua machista e não
muda. O que nós vemos em muitas propagandas, tanto as exemplificadas aqui,
quanto em muitas outras (produtos de limpeza, de comida, carros) são mulheres
reduzidas a um corpo, que muitas vezes é um peito e uma bunda. Essas propagandas
ressaltam apenas características físicas da mulher e não defendem nem mesmo sua
naturalidade. A maior parte dos cabelos é falsa, assim como as próprias bundas
e os próprios peitos. As coxas e pernas também são moldadas em busca da “perfeição”.
A mulher bonita é aquela magérrima (vejam as Angels da Victoria’s Secrets) ou
aquela malhadona, com bundão e peitão.
E
o que mais me impressiona nisso tudo é ver que, por exemplo, no curso de
publicidade da PUC-Rio (faculdade onde estudo cinema), a maior parte dos
estudantes é de mulheres! Gente, cadê essas mulheres no mercado publicitário? Já chega
dessa visão machista a respeito do que se resume a mulher (e por acaso ela se resume?), já chega de mostrá-la como um
objeto, como alguém fútil e idiota. Ao mesmo tempo que temo a juventude em que
vivo, eu coloco fé nela. Coloco fé porque acredito que ainda existem cabeças
que podem mudar essas imagens e que podem mudar o mundo. Eu tenho a esperança de que ainda há pessoas boas nesse mundo.
Com
tudo isso que acontece, eu fico querendo fugir. Sair daqui, dessa cidade
violenta, desse país preconceituoso. Mas... ir para onde? Cada país tem seus
problemas, seus preconceitos, seus machismos, seus xenofobismos, seus absurdos... me dá
vontade de pegar um foguete e povoar Vênus para tentar criar um mundo mais
agradável de se viver. Mas já que isso não é possível, o jeito é tentar lutar
para que o nosso mundo seja melhor. Mesmo que isso leve anos. Eu não quero
achar que é utópico um mundo em que homens, mulheres, brancos, negros, gays e
heteros têm os mesmos direitos. Isso não é utopia. Isso é cidadania básica. Isso é necessidade para uma convivência normal nesse planeta Terra. Nós merecemos isso.
Marina N. Martins