segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Mais um de machismo

Ta escrito e é em rosa!

E mais uma vez tenho um dia onde preciso me indignar com o machismo. Mais uma vez me irrito, me estresso, fico me lamentando. Tudo começa na Timóteo da Costa, a caminho do ponto de ônibus. Em frente a um prédio, há um grupo de quatro homens passando uma porta, ou uma placa, de vidro, do edifício para o caminhão. Paro ao lado do caminhão para atravessar a rua, estou no celular com o meu namorado. Ainda não atravessei a rua, então um deles me diz “Pode passar por aqui, já acabamos”. Ingênua e um pouco desligada, agradeço e passo entre os homens. Pra que? Enquanto um sorri pra mim com um sorriso nojento e tarado, o outro me diz “Que coisa mais linda”, com uma voz nojenta e tarada, e os outros dois aproveitavam antes dos colegas para apreciar a parte traseira do meu corpo. Não aguentei e comecei a falar bem alto no celular, para o meu namorado, o quanto aqueles homens eram idiotas e desrespeitosos.

Já esperando o ônibus na Visconde de Albuquerque, há uma Kombi vindo bem devagar. Já me preparei para o pior. E não é que estava certa? O pirralho que estava no banco do carona fez questão de dizer “Que coisa mais linda”, novamente com aquela voz tarada e nojenta. O moleque deve ter aprendido com o papai dele a ser grosso com as mulheres! E não adianta dizer que essas pessoas estão me elogiando, ou que eu estava com um short muito curto (eu uso a roupa que eu bem entender), ou que sou uma pessoa bonita mesmo... não se trata de nada disso. O que esses idiotas fazem é invadir o espaço das mulheres de maneira covarde e desrespeitosa, achando que elas não se importam em ouvir esses “elogios” que acabam se tornando ofensas. Não importa a roupa que estou vestindo, a maquiagem que estou usando, meu corte de cabelo... isso não é motivo para homem nenhum achar que está no direito de comentar sobre mim de maneira grosseira! Eu não ia me importar se qualquer pessoa me pedisse licença, me parasse na rua e dissesse “Só queria te dizer que você é muito bonita”. Isso sim seria um elogio! Aí sim eu agradeceria e continuaria bem, feliz, sem precisar me irritar com gente desrespeitosa.

E como se já não bastasse, pego o vagão das mulheres no metrô mais tarde, sentido Zona Sul. Que absurdo... Entro no vagão procurando um lugar para sentar e não acho. Quando me dou conta, há sim um lugar vazio. Andando para sentar no banco, sou interrompida por uma pessoa que é mais rápida do que eu. Ah, sim! Essa pessoa é um homem. Penso se vou pedir licença pra ele, se vou avisar que o vagão é de mulheres, se vou falar com ele. Mas assim como as outras mulheres, não digo nada. Tenho medo do que ele pode me responder, do que ele pode fazer. Não sei quem é ele, não sei o que ele pode ter na cabeça, ou na bolsa. As estações passam e fico eu lá, em pé perto dele, olhando pro rosto dele, muito indignada. Outro banco vaga, vou até lá, assim paro de ter que olhar pro imbecil sentado, enquanto uma mulher está em pé em seu próprio vagão.

Em cada estação, entram mais e mais homens. Fiscalização? Tem sim, mas apenas no sentido Zona Norte. No sentido que vai à Ipanema, os homens entram, sentam e deixam mulheres em pé. As mulheres entram COM os homens em um vagão que é DELAS. Ninguém olha, ninguém diz nada, ninguém faz nada. Não há guardas, não há fiscalização. Não seria mais simples alterar o vagão das mulheres para: FUNCIONAMENTO APENAS EM SENTIDO ZONA SUL? Para que inventar a merda de uma regra que não é cumprida? Ninguém se importa, ninguém se indigna! As próprias mulheres acham normal, não se incomodam e desrespeitam o seu PRÓPRIO direito. O vagão das mulheres poderia ter seu nome trocado para: vagão das mulheres, dos homens que fingem ser desligados, daltônicos ou analfabetos, e dos machistas. Ah, e dos poucos que realmente estão apressados e distraídos e se enganam, pois eles também existem e não fazem por mal.

Ao longo dos anos, sofremos tanto com o preconceito, que é cada vez mais vencido, mas que ainda existe... somos uma maioria tratadas como minoria insignificante em pleno século XXI. Tanta tecnologia, tantas mudanças e a cabeça das pessoas continua quase a mesma. Que vergonha. Precisamos ter nosso próprio vagão porque certos homens não conseguem respeitar nosso espaço e intimidade, então temos que nos manter longe deles, para que não haja assédios. Ainda assim, nem eles, e nem as próprias mulheres conseguem respeitar um espaço dedicado a nós. Mais uma vez o Brasil vai mostrando a cara e deixando mulheres, como eu, indignadas. Mais do que isso: envergonhadas de seu próprio país e da sociedade em que vivem. 

Marina Martins

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Chega uma hora




Eu quando aprendi a andar.


Chega uma hora na vida em que você tem que aceitar que estar crescendo. E isso não ocorre porque você já se formou, está matriculado em uma faculdade ou está mais ou menos perto de fazer dezoito anos. Acontece quando você toma coragem em fazer uma limpa radical no seu quarto, que você está planejando mudar, e se depara com memórias gostosas da sua infância, sua pré-adolescência.



Já é a quinta vez em minha vida que eu mudo um quarto. Primeiro, foi da minha primeira casa na Barra (que eu não me lembro, pois saí de lá com menos de um ano) para a casa no Leblon. Depois, o quarto de bebê na Visconde de Albuquerque mudou para quarto de criança. A terceira mudança de quarto foi quando eu me mudei de casa novamente, dessa vez pro Alto Leblon. A quarta mudança foi quando eu percebi que meu quarto estava ultrapassado e eu precisava de um quarto de “mocinha”. Agora estou planejando a quinta mudança; talvez a mocinha esteja precisando de um quarto de – que medo de usar essa palavra – adulta. A cama de casal já tem, mas faltam algumas coisas ainda... então hoje eu resolvi fazer uma limpa em meus livros e, como minha mãe pediu, tirar os trambolhos que estão na parte de cima do armário.



Depois de separar sete sacolas de livros – que serão destinadas a um orfanato, pessoas que tiveram suas casas prejudicadas em Xerém, minha prima e minha sobrinha – resolvo abrir a primeira porta de armário. Já na arrumação de livros me emocionei ao lembrar de tantos momentos bons vividos em épocas tão gostosas e diferentes da minha vida. E é claro que de certos livros eu simplesmente não consigo me desfazer. Ou eles marcaram demais, ou serão repassados aos meus filhos quando eu fizer uma nova limpeza de livros, daqui a uns dez anos. Enfim, na primeira porta que abro encontro duas sacolas e nelas estão os meus bichinhos de pelúcia. Aqueles bichinhos que moravam na minha cama, depois passaram a uma prateleira e agora estão em sacolas. Lembrei que eles ainda estão aqui porque não tive coragem de doá-los. Mas hoje, depois de chorar e me emocionar, separei as sacolas de bichinhos (todos com nomes, e eu lembro de todos). Eles estão junto com os livros que serão doados.



Então, um dia chega uma hora em que você vê que realmente cresceu: você não precisa mais de livrinhos de criança e também não quer mais aqueles tantos bichinhos de pelúcia, pois eles só estão empoeirando seu quarto. Hoje você tem o seu namorado para dormir junto, não precisa mais de tantos bichos (exceto alguns poucos que você jamais vai se desfazer). Chega uma hora em que você se despede da infância de vez e ela não passará de lembranças deliciosas por entre livros guardados, fotos e, eternamente, por sua memória.

Marina Martins

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

312


Falta

Você deixou um vazio
que jamais será preenchido.
Sinto-me afogada num rio
profundo e desconhecido.

Queria chegar em casa
e poder te telefonar,
ou então criar asas
para ir te visitar.

Queria poder te ver
e dizer como você é linda.
Podia conseguir entender
as injustiças da vida...

Sorte que a saudade não mata,
só tortura de vez em quando.
Um dia, espero ser conformada
de não te ouvir mais me chamando.

Marina Martins

Feito tatuagem



Quero ter-te em minha pele, na forma de tatuagem, para estarmos sempre grudadas. Tenho medo da dor, verdade. Mas ela não será maior do que a de ter te perdido. Quero que faças parte de mim, materializada de alguma forma, para sempre. Que tu sejas uma memória jamais esquecida ou apagada. Só na presença em tinta poderás viver comigo, crescer comigo, envelhecer comigo, estar comigo. Daqui a uns meses, enquanto tua imagem de flor estiver sendo pintada em mim, serei forte. Se a dor estiver muito intensa, pensarei que ela é passageira e não terei problema em sofrer. Fecharei os olhos e pensarei em ti. Talvez, contigo estando para sempre comigo, a saudade diminua. Talvez a tua imagem em forma de tinta me faça sentir menos dor... tu me manques.

Marina Martins

Quem me estuprou

Não, eu não fui estuprada. Esse título é apenas o do conto, escrito por uma autora que eu até então desconhecia, mas que achei sensacional. Ela pegou pesado demais? É estranho pensar do jeito dela? Talvez. Mas eu acho que não. Inclusive acho que muitas mulheres se sentem assim. Pode ser que não nos sintamos estupradas pelas atitudes que a autora cita, mas desrespeitadas e invadidas no mínimo. E quem não se sente assim, peço desculpas, mas não se sentem como mulheres.

"Hoje fui estuprada. Subiram em cima de mim, invadiram meu corpo e eu não pude fazer nada. Você não vai querer saber dos detalhes. Eu não quero lembrar dos detalhes. Ele parecia estar gostando e foi até o fim. Não precisou apontar uma arma para a minha cabeça. Eu já estava apavorada. Não precisou me esfolar ou esmurrar. A violência me atingiu por dentro.

A calcinha, em frangalhos no chão, só não ficou mais arrasada do que eu. Depois que ele terminou e foi embora, fiquei alguns minutos com a cara no chão, tentando me lembrar do rosto do agressor. Eu não sei o seu nome, não sei o que faz da vida. Mas eu sei quem me estuprou.

Quem me estuprou foi a pessoa que disse que quando uma mulher diz “não”, na verdade, está querendo dizer “sim”. Não porque esse sujeito, só por dizer isso, seja um estuprador em potencial. Não. Mas porque é esse tipo de pessoa que valida e reforça a ação do cara que abusou do meu corpo.

Então, quem me estuprou também foi o cara que assoviou para mim na rua. Aquele, que mesmo não me conhecendo, achava que tinha o direito de invadir o meu espaço. Quem me estuprou foi quem achou que, se eu estava sozinha na rua, na balada ou em qualquer outro lugar do planeta, é porque eu estava à disposição.

Quem me estuprou foram aqueles que passaram a acreditar que toda mulher, no fundo no fundo, alimenta a fantasia de ser estuprada. Foram aqueles que aprenderam com os filmes pornô que o sexo dá mais tesão quando é degradante pra mulher. Quando ela está claramente sofrendo e sendo humilhada. Quando é feito à força.

Quem me estuprou foi o cara que disse que alguns estupradores merecem um abraço. Foi o comediante que fez graça com mulheres sendo assediadas no transporte público. Foi todo mundo que riu dessa piada. Foi todo mundo que defendeu o direito de fazer piadas sobre esse momento de puro horror.

Quem me estuprou foram as propagandas que disseram que é ok uma mulher ser agarrada e ter a roupa arrancada sem o consentimento dela. Quem me estuprou foram as propagandas que repetidas vezes insinuaram que mulher é mercadoria. Que pode ser consumida e abusada. Que existe somente para satisfazer o apetite sexual do público-alvo.

Quem me estuprou foi o padre que disse que, se isso aconteceu, foi porque eu consenti. Foi também o padre que disse que um estuprador até pode ser perdoado, mas uma mulher que aborta não. Quem me estuprou foi a igreja, que durante séculos se empenhou a me reduzir, a me submeter, a me calar.

Quem me estuprou foram aquelas pessoas que, mesmo depois do ocorrido, insistem que a culpada sou eu. Que eu pedi para isso acontecer. Que eu estava querendo. Que minha roupa era curta demais. Que eu bebi demais. Que eu sou uma vadia.

Ainda sou capaz de sentir o cheiro nauseante do meu agressor. Está por toda parte. E então eu percebo que, mesmo se esse cara não existisse, mesmo se ele nunca tivesse cruzado o meu caminho, eu não estaria a salvo de ter sido destroçada e de ter tido a vagina arrebentada. Porque não foi só aquele cara que me estuprou. Foi uma cultura inteira.

Esse texto é fictício. Eu não fui estuprada hoje. Mas certamente outras mulheres foram.''

Aline Valek

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

311

Francamente!

Não mente
a franca mente,
apenas mente
a fraca mente.

Marina Martins, que não suporta mentiras.

Nós outros ou Utopia particular



De vez em quando dou-me conta do universo pessoal de utopia em que, por vezes, vivo. Essa minha mania de procurar sempre pela paz e achar que tudo poderia ser resolvido com o amor... não sei. Não gosto de brigar, não gosto quando as pessoas brigam. Mas tal mania pode acabar me decepcionando, já que o amor nem sempre prevalece: as pessoas pensam muito nelas mesmas.
Em minha utopia particular, ninguém precisa mentir, desrespeitar ou brigar; nada disso é necessário. Tudo é resolvido com palavras tranquilas e respeitosas, repletas de verdade e sinceridade. Ao final, tudo termina com um abraço longo e verdadeiro. Nessa utopia, tudo vai dar certo. Sempre.
Mas não. O ser humano é superior demais para sentir-se inferior. Abrir mão? Claro que não. Mesmo sabendo que estamos errados, queremos que o outro nos prove que estamos errado, queremos que o outros nos prove porque erramos. Aceitar os erros? Talvez. Arrepender-se? Quem sabe, por um tempo. Desculpar-se? Pode ser, mas às vezes da boca pra fora.
Incrível. Precisamos enganar, brigar, mentir. Temos a necessidade de nos aumentar, os outros precisam achar que somos grandes, enormes! Os outros... quem são eles? São exatamente iguais a nós. E é por sermos tão iguais que todos se enganam, brigam e pensam tanto em si mesmos. Enquanto isso, permaneço imersa em minha utopia, que não passa de uma utopia boba, achando que o amor algum dia prevalecerá na cabeça de nós outros.

Marina Martins; escrito há algum tempo atrás.