quarta-feira, 2 de julho de 2014

Com muito orgulho, com muito amor. Sempre.

Antes de começar a escrever o texto, adianto logo duas observações: 1. Não sou ufanista, mas amo demais meu país e não o trocaria por nada (não por muito tempo). 2. É claro que muitos dos comentários feitos a seguir serão generalizações. Para toda “regra”, existem muitas e muitas exceções, mas vou escrever simplesmente o que observo, e também não estou aqui para ditar nenhuma! Só quero dizer uns pensamentos que estão perambulando pela minha cabeça há umas semanas.
            Antigamente, considerava-se que nosso mundo era dividido em três. Nessa teoria, o Brasil estaria no Terceiro Mundo. Depois, adotou-se uma forma mais “correta” de se apelidar nosso país e viramos um País Subdesenvolvido. Hoje em dia, já estamos Em Desenvolvimento. Mas ainda tem muita gente que usa a nominação “país de primeiro mundo” ou “país de terceiro mundo”. De segundo, nunca ouvi.
            Como sempre tive o hábito e a sorte de viajar, conheço muitos lugares no Brasil e na Europa. Também conheço alguns na América do Sul, os EUA. América Central, Ásia e África estão na lista. Enfim. Isso tudo foi uma pequena introdução para falar bem do meu país, sem falar mal dos outros. Ou falar mal do meu país, sem falar bem dos outros. Ou falar bem e mal dos dois, deixa eu ver o que sai.
            O hemisfério norte, e nesse caso a Europa, é visto como um exemplo a ser seguido. Aí é que eu te pergunto: exemplo de que? Organização, pontualidade, serviços? É, pode ser. Realmente, nesse sentido as coisas funcionam muito melhor aqui do que no Brasil. Mas acho que a felicidade de viver em um país não se localiza apenas aí. É claro que o serviço público no Brasil é uma piada, mas nosso país tem muitas qualidades que a Europa não nos oferece.
            A Alemanha é perfeitamente organizada e todos recebem os turistas muito bem. Mentira. Comigo, pelo menos, não foi nada assim. Fui ano passado a Berlim com uma amiga e nos sentimos dois lixos. Muitas pessoas foram extremamente grossas, muitas se recusavam a falar inglês. A falta de placas em uma das maiores estações da cidade, perto de um dos locais mais turísticos, nos impressionou e nos deixou bastante perdidas. Em compensação, o metrô de lá é o melhor que já peguei. Ele fica mais tempo parado nas estações, o que impede as pessoas de se empurrarem. E só peguei ele lotado uma vez. Mesmo assim, não passei sufoco nenhum.
            A pontualidade suíça é impressionante e as coisas funcionam perfeitamente bem. Verdade. Mas estou para conhecer um povo mais frio que eles. Tenho uma amiga suíça que é uma linda e não é nada fria (como falei, existem exceções), mas no geral, são muito frios. A cultura do beijo e do abraço não existe lá. Ninguém chora quando está triste. Todos se fiscalizam o tempo inteiro para saber se o outro está fazendo a coisa certa – isso, quem me disse foi uma suíça, não estou inventando. Acho que mais ou menos as mesmas coisas funcionam para a Inglaterra. É um país completamente organizado e as pessoas são muito pontuais, mas também são muito frios. É raro ver as pessoas se tocando.
            Os franceses são todos grossos, mal humorados e na França os turistas são tratados muito mal. Para mim, não é verdade. Essa é a minha quinta vez em Paris e eu só tive um estresse. Eu tinha oito anos e o motorista de taxi encrencou com meu pai. Fora isso, alguns mal humorados pelas ruas e metrôs, mais nada. Sim, eles esbarram, empurram, emburram, bufam, os motoristas de taxi decidem onde querem te deixar e se irritam se você não deixa gorjeta, mas você aprende a agir como eles. Depois de um tempo, já está tirando de letra o jeitão parisiense. Eu e minha mãe aprendemos que eles gostam de uma verdade na cara. Se um francês gritar com você, grita de volta. Ele vai ficar caladinho. Se um francês não for legal com você, joga na cara. Logo, ele já estará todo arrependido e querendo te agradar. Eu tive sorte de ser sempre atendida por garçons legais, que elogiaram meu francês, me ajudaram a falar. Os motoristas de ônibus foram todos os fofos e me deram informações completas e boas. Hoje em dia, muitas pessoas aqui falam inglês e nem se irritam quando falam.
            Através dos europeus que conheci ao longo da minha vida, percebi que na Europa a relação entre as pessoas é muito diferente da que temos no Brasil, e na América Latina, de um modo geral. Ah, e Portugal. Eu amei os portugueses. A Itália e a Espanha são um pouco mais parecidos conosco, mas não sei dizer muito bem. Talvez por falta da existência do sentido de Saudade, parece que muitos europeus não a sentem. Eu sofro de saudade, choro rios de lágrimas, nunca esqueço pessoas que me marcaram, por mais passageiro que isso tenha sido. Aqui, o esforço que eles fazem para ver alguém de quem sentem falta é pouco ou quase nulo. E depois de anos sem encontrar uma pessoa, a primeira reação não é um abraço apertado. Outro dia, encontrei um amigo francês que não via há quatro anos. Ele veio me dar dois beijinhos. GENTE, dois beijinhos! Eu dou dois beijinhos em qualquer cidadão no Rio de Janeiro. Aí eu disse pra ele que, no Brasil, a gente abraça e já saí logo dando um abração nele. Na despedida, ele já tinha aprendido e tomou a iniciativa de me abraçar. Ano passado, encontrei meu amigo alemão. O primeiro abraço dele foi bem tímido. Na hora de dar tchau, ele já parecia um verdadeiro carioca.
            No Rio, ninguém é pontual, todo mundo se enrola na hora de marcar coisas, os ônibus são uma bosta, os motoristas dirigem horrorosamente mal, temos duas linhas de metrô, vivemos com medo de ser assaltados. Mas eu nunca conheci uma cultura tão “quente” como a carioca, até a brasileira em geral. No Brasil, as pessoas são felizes e isso é reconhecido pelo resto do mundo. Minha professora de francês me perguntou se tinha alguma explicação pro meu povo ser tão feliz. Eu não soube dizer, mas sei que sou. Meu amigo me perguntou se eu preferia o Rio ou Paris. Rio, sem pestanejar. “It’s my city!”. Ele perguntou se era a minha preferida só porque era a minha cidade. É, talvez. Mas eu não conheço cidade mais linda. Eu fico emocionada quando chego no Rio depois de uma viagem. Mesmo com todos os problemas, me sinto bem e sei que pertenço àquilo. Eu preciso daquele sol, daquele mar, daquele calor. Preciso abraçar e beijar quem acabei de conhecer, quem conheço há anos. Preciso tocar em pessoas desconhecidas quando peço informações, cutucar a pessoa da frente pra dizer que a fila andou, apoiar a mão no ombro pra pedir licença, colocar a mão do braço pra pedir desculpas.
                   Outra coisa que admiro muito no meu povo é a nossa higiene. É fácil perceber a nossa preocupação com a limpeza, no geral. Da pessoa mais rica à mais pobre, a gente pode sentir um cheirinho de perfume quando ela passa por nós na rua. É muito difícil eu encontrar alguém que esteja com um cheiro azedo e podre de cecê, usando uma camisa mal lavada. A gente toma banho todo dia, mais de uma vez por dia, e a maioria das pessoas lava os cabelos todo santo dia. Nós crescemos ouvindo a frase "dinheiro é sujo" e "lava a mão quando chegar em casa". Aqui em Paris, por exemplo, não é costume lavar as mãos antes de comer. Nas padarias, por mais chiques que sejam, a pessoa que pega o meu dinheiro, pega meu pão com a mesma mão. No Brasil, isso não acontece nem em pé sujo. Pelo menos um guardanapinho vai ser usado na hora de se pegar em comida. Ah, e ninguém mete a mão na comida do outro, sem permissão. É falta de educação. É nojento.
            Não existe o melhor país do mundo. Cada país, cada cidade, tem seus altos e baixos. É claro que muitas (muitas!) coisas no Brasil me tiram do sério, mas eu não conheço povo mais gostoso que o meu! Tem muito brasileiro que diz que “brasileiro é um povinho de merda” e eu sinto nojo dessa frase.  O que define um povo de merda? Porque, sinceramente, se ser um merda é tratar bem turista, fazer mímica pra entendê-los, abraçar e beijar todo mundo, fazer amizade com brasileiro em qualquer lugar do planeta Terra, falar e rir alto, ter intimidade com quem acabou de conhecer e morar no Brasil, eu tenho orgulho de ser uma merda. Eu não me considero uma merda. Não considero meu povo, meu país, assim. A cada viagem que faço, percebo a SAUDADE que meu país, minha cidade deixam em mim. E essa saudade, primeiro mundo nenhum consegue entender.

Marina Martins, já com saudade de casa.

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